O que começou como uma vitória contra a companhia de energia elétrica Enel quase terminou em um grande prejuízo financeiro. Após ganhar na Justiça o direito a uma indenização por danos morais, uma consumidora foi alvo de um golpe sofisticado, praticado por criminosos que tiveram acesso aos detalhes do processo.
Em 2021, a jovem teve sua energia cortada por falta de pagamento. No entanto, mesmo após quitar a dívida no dia seguinte, a religação demorou dias para ser realizada. “O corte aconteceu numa sexta-feira, e fiquei sabendo que isso, inclusive , é proibido por lei. Liguei várias vezes para a Enel, mas nada foi resolvido. Passei três ou quatro dias sem energia, sem saber o que fazer”, relata.
Sem saber o que fazer, começou a pesquisar e viu que uma das opções era buscar a justiça para ter a energia da sua residência restabelecida. Foi quando buscou ajuda na Defensoria Pública do Estado do Ceará por meio do WhatsApp. À época, o atendimento aconteceu de forma remota devido à pandemia da Covid-19.
“Enviei toda a documentação para a defensora e ela me retornou informando que no mesmo dia o juiz havia determinado que a Enel deveria religar minha energia em 24 horas, sob pena de multa. Fiquei tão surpresa com a resposta que mostrei para todo mundo no meu trabalho. Só depois disso minha energia foi religada”, conta.
Além de garantir o restabelecimento do serviço, a Defensoria ingressou com uma ação pedindo indenização por danos morais. O processo seguiu na Justiça e a decisão favorável à consumidora saiu em 2024. No entanto, ela só descobriu a existência da indenização neste ano, quando recebeu um contato inesperado e quase caiu em um golpe.
Usando um aplicativo de mensagem com a foto da Defensoria Pública, uma pessoa entrou em contato informando que o valor da indenização já estava disponível e que um advogado faria os trâmites para a transferência. “No dia seguinte, um suposto advogado me ligou por vídeo. Eu já tinha feito todo o processo pelo WhatsApp, então não achei estranho. Ele tinha acesso a todo o meu processo, documentos e até a minha conta de energia. Acreditei que era legítimo”, relata.
Durante a chamada, o golpista pediu para que ela compartilhasse a tela do celular e acessasse o aplicativo do banco. Como usa biometria para login, a vítima não precisou digitar a senha, o que acabou impedindo que o criminoso concluísse o golpe. Além disso, o homem usou o sobrenome da defensora atuante no caso para confundir ainda mais a vítima.
“Ele começou a pedir que eu tivesse pelo menos R$ 100 na conta para liberar a transferência e perguntou se eu tinha algum empréstimo disponível. Foi aí que achei tudo muito estranho e desliguei a ligação para confirmar com a Defensoria. Quando ele percebeu que não conseguia me enganar, mandou um comprovante falso de Pix, dizendo que já tinha me roubado”, conta.
Felizmente, a vítima não teve dinheiro furtado, mas ficou alarmada com a facilidade com que os criminosos acessaram informações confidenciais. “Eles tinham dados do meu processo que nem eu conseguia ver no site do Tribunal de Justiça, pois eram protegidos por senha. Isso me preocupa muito, porque qualquer pessoa pode consultar processos apenas com o nome? Deveria haver mais segurança, como uma validação em duas etapas”, sugere.
Defensoria alerta: serviço é totalmente gratuito
Casos como esse têm se tornado cada vez mais frequentes, alerta a defensora pública Priscilla Gusmão, titular da Defensoria Cível onde o processo tramitou. Segundo ela, criminosos utilizam informações públicas dos processos para enganar vítimas, simulando procedimentos legítimos.
“A pandemia da Covid-19 mudou nossa forma no atendimento e iniciamos o trabalho remoto que se tornou uma realidade no sistema de justiça, mas é necessário ficar atento a solicitações de pessoas que entram em contato se identificando como integrantes de determinadas instituições solicitando dados bancários, pagamentos antecipados ou qualquer tipo de transação financeira. Se alguém receber esse tipo de abordagem, deve entrar em contato imediatamente com a Defensoria pelos canais oficiais e nunca compartilhar informações pessoais ou bancárias”, orienta. Ela reafirma que a Defensoria não cobra nenhuma taxa, pagamento ou transferência em nenhum atendimento.
A defensora reforça ainda a importância de consultar diretamente os órgãos competentes antes de realizar qualquer operação financeira. “A melhor forma de se proteger é desconfiar de contatos inesperados, especialmente se houver pedidos para transferências, pagamentos ou compartilhamento de telas. Golpistas estão cada vez mais sofisticados, então é essencial adotar medidas de precaução para evitar prejuízos”, finaliza.