Enquanto espera para tomar banho em um banheiro móvel, embaixo do viaduto da Avenida Brasil com a Avenida Goiás, em Anápolis, Rodrigo (nome fictício)* recebe atendimento jurídico da Defensoria Pública. Com apenas 21 anos, o jovem em situação de rua busca pela emissão da segunda via de sua certidão de nascimento, para poder trabalhar. “Roubaram minha mochila e meus documentos estavam dentro de uma pasta, dentro da bolsa. Tentei procurar outro serviço, mas pediram o documento”, conta. Rodrigo foi uma das 14 pessoas assistidas pela Defensoria Pública do Estado de Goiás (DPE-GO), no projeto Defensoria na Rua, realizado na noite desta última quarta-feira (10/07), no município.
“Perdi meus documentos todos, e aí não consegui mais trabalho. Graças a Deus, a Defensoria apareceu aqui hoje e consegui tirar minha certidão. Daqui dez dias eu vou buscar e, a partir dela, vou tirar os outros e tentar recomeçar de novo”, afirmou. Rodrigo saiu de Planaltina há três anos e, após dificuldades enfrentadas em Brasília, há quatro meses foi em busca de emprego como servente de obras em Anápolis. Apesar de ter conseguido o trabalho de carteira assinada, com o fim da obra, o jovem se viu desamparado e passou a morar nas ruas. “Eu durmo nas praças, nos becos, nas calçadas, nas marquises. É complicado”, lamentou.
A emissão de certidão de nascimento também foi uma demanda de Francisco (nome fictício)*, 48 anos, que vive em situação de rua no município há cerca de um ano e meio. O ex-vidraceiro deseja voltar a trabalhar, mas também encontra dificuldades, pois perdeu todos os documentos. Com o atendimento da DPE-GO, Francisco garantiu. “Aí eu já vou pedir pra tirar a identidade. Vai ser bom porque eu vou ter como trabalhar e juntar um dinheiro para poder alugar uma casa pra mim. Até pra alugar um barraco você precisa de documento”, afirmou.
Nesta edição do Defensoria na Rua, o projeto contou com a parceria da organização Irmãos Invisíveis, que levou até o local um banheiro móvel, para promover o 'banho solidário'. Com isso, a população em situação de rua no local pôde, além de receber atendimento integral e gratuito pela DPE-GO, tomar banho, receber roupas novas, cobertores e marmitas. Por meio do projeto Absorver, outro parceiro, também foram distribuídos absorventes às mulheres.
Participaram da ação as defensoras públicas Fernanda Oriá, Larissa Pabline Galvão e Mylena Lorusso. Fernanda Oriá enfatizou que a atuação da Defensoria é facilitada pelo contato com grupos que já trabalham com a população em situação de rua. “A dificuldade de atuar em prol da população em situação de rua é o acesso dessas pessoas à Instituição, até mesmo saber onde está localizada, o que a Defensoria Pública faz. Esse tipo de atuação é uma forma de a gente se aproximar e levar o acesso à justiça, literalmente, até elas”, destacou.
Ainda segundo Fernanda, “verificamos que o primeiro dos direitos, que é o direito de existir, inclusive de forma digna, como cidadão, ou seja, ter uma documentação, muitos deles não tem”. Além da demanda principal de emissão de documentos de registro civil, a Defensoria Pública atua, por meio do Defensoria na Rua, na verificação de processos em diversas áreas e orientações jurídicas acerca de possíveis direitos que a população possa ter, incluindo demandas de saúde, benefícios sociais e outras.
Para Rodrigo, seu recomeço, a partir da emissão dos novos documentos, inclui o sonho de sair das ruas. “Meu sonho mesmo é só trabalhar e prosseguir na vida, conquistar minhas coisas, fazer uma família e tocar a vida”, disse. Francisco compartilha de um sonho parecido: superar a situação de rua e encontrar um lugar para morar. “Hoje eu precisaria só de um barraco pra eu poder me erguer. Só de um barraco”.
*O nome do assistido foi alterado para preservá-lo.
