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24/10/2008

Supremo garante fornecimento gratuito de medicamento a portadora de leucemia crônica em caso patrocinado pela Defensoria Pública de Alagoas

Fonte: Supremo Tribunal Federal
Estado: DF

Alagoana portadora de leucemia linfocítica crônica terá medicamento fornecido gratuitamente pelo estado de Alagoas. A determinação é do ministro Gilmar Mendes, presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) que negou pedido do estado na Suspensão de Tutela Antecipada (STA) 278.

A paciente alegava não dispor de condições financeiras para arcar com os custos do tratamento, cerca de R$ 162 mil. A ação foi ajuizada contra decisão da 17ª Vara Cível da Comarca de Maceió, mantida pelo Tribunal de Justiça.

No TJ-AL, o governo estadual pediu a suspensão dos efeitos da antecipação de tutela, sob o argumento de que o medicamento não consta da Portaria 5277, do Ministério da Saúde. Para o estado, o fornecimento seria responsabilidade do município de Maceió. O pedido foi negado por aquele Tribunal.

"A decisão que determinou ao Estado de Alagoas o seu fornecimento, se suspensa, poderá acarretar dano irreparável para a autora", disse o ministro Gilmar Mendes. De acordo com o relator, o fornecimento do medicamento à paciente não representa lesão à ordem pública, como sustentado pelos procuradores.

O ministro considerou que, "apesar da responsabilidade dos entes da federação em matéria de direito à saúde suscitar questões delicadas, a decisão impugnada, ao determinar a responsabilidade do Estado no fornecimento do tratamento pretendido, segue as normas constitucionais que fixaram a competência comum (art. 23, II, da CF), a Lei Federal nº 8.080/90 (art. 7º, XI) e a jurisprudência desta Corte".

Para Mendes, "não é possível vislumbrar grave ofensa à ordem, à saúde, à segurança ou à economia públicas a ensejar a adoção da medida excepcional de suspensão de tutela antecipada". Por esse motivo, o presidente do STF indeferiu a ação proposta pelo estado de Alagoas.

Leia a íntegra da decisão.
EC/LF
SUSPENSÃO DE TUTELA ANTECIPADA 278-6 ALAGOAS
RELATOR
: MINISTRO PRESIDENTE
REQUERENTE(S) : ESTADO DE ALAGOAS
ADVOGADO(A/S) : PGE-AL - RODRIGO SIQUEIRA
CAVALCANTE
REQUERIDO(A/S) : TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE
ALAGOAS (AGRAVO REGIMENTAL EM
SUSPENSÃO DE EXECUÇÃO DE LIMINAR Nº
2008.001847-2/0001.00)
REQUERIDO(A/S) : JUÍZA DE DIREITO DA 17ª VARA CÍVEL
DE ALAGOAS (PROCESSO Nº
001.08.083792-2)
INTERESSADO(A/S) : MARIA DE LOURDES DA SILVA
ADVOGADO(A/S) : DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DE
ALAGOAS
DECISÃO:

Trata-se de pedido de suspensão da antecipação da tutela recursal, ajuizado pelo Estado de Alagoas, contra decisão do Juízo de Direito da 17ª Vara Cível da Comarca de Maceió, mantida pelo Tribunal de Justiça daquele Estado, que determinou ao Estado de Alagoas o fornecimento do medicamento denominado MABTHERA (Rituximabe) em favor de MARIA DE LOURDES DA SILVA. Na origem, MARIA DE LOURDES DA SILVA ajuizou ação cominatória (fls. 20-24), com pedido de tutela antecipada, contra o Estado de Alagoas, com o fim de obter da Secretaria de Saúde Estadual o fornecimento gratuito do medicamento MABTHERA (Rituximabe), nas dosagens 500mg e 100mg, por ser portadora de Leucemia Linfocítica Crônica (CID C91.1) e não dispor de condições financeiras para arcar com os custos do tratamento, orçado em R$ 162.707,16 (12 frascos de Mabthera 500Mg no total de R$ 90.332,04 e 24 frascos de Mabthera 100Mg no total de R$ 72.375,12). O Juízo da 17ª Vara Cível do Tribunal de Justiça do Estado de Alagoas deferiu a antecipação de tutela vindicada (fls. 25-30).

O Estado de Alagoas pediu ao Presidente do Tribunal de Justiça a suspensão dos efeitos da antecipação de tutela deferida, sob o argumento de que o medicamento não consta da Portaria n o 5.277 do Ministério da Saúde, sendo o seu fornecimento responsabilidade do Município de Maceió (fls. 11-18). O pedido de suspensão foi indeferido pelo Presidente do TJ/AL (fls. 32-35). Contra o indeferimento monocrático do pedido de suspensão, o Estado de Alagoas interpôs agravo regimental (fls. 38-46), ao qual foi negado provimento, por unanimidade, pelo órgão Plenário do TJ/AL (fls. 48-55).

No pedido de suspensão formulado a esta Suprema Corte, o Estado de Alagoas alega, em síntese, existência de lesão à ordem, à economia e à saúde públicas, porquanto a ação contempla medicamento cujo fornecimento cabe ao Município de Maceió, pois não está previsto na Portaria no 2.577 do Ministério da Saúde. Alega, ainda, que o fornecimento de medicamentos não estabelecidos no âmbito de sua atribuição pela Lei n o 8.080/1990, a qual dispõe sobre as condições para a promoção, proteção e recuperação da saúde, afeta a programação estatal, acarretando despesas excessivas, o que compromete a qualidade dos serviços de saúde pública prestados pelo Estado.

Decido.
A base normativa que fundamenta o instituto da suspensão (Leis nos 4.348/1964, 8.437/1992, 9.494/1997 e art. 297 do RI-STF) permite que a Presidência do Supremo
Tribunal Federal, para evitar grave lesão à ordem, à saúde, à segurança e à economia públicas, suspenda a execução de decisões concessivas de segurança, de liminar ou de tutela antecipada, proferidas em única ou última instância, pelos tribunais locais ou federais, quando a discussão travada na origem for de índole constitucional. Assim, é a natureza constitucional da controvérsia que justifica a competência do Supremo Tribunal Federal para apreciar o pedido de contracautela, conforme a pacificada jurisprudência desta Corte, destacando-se os seguintes julgados: RCLAgR no 497/RS, Rel. Carlos Velloso, Plenário, maioria, DJ 6.4.2001; SS-AgR no 2.187/SC, Rel. Maurício Corrêa, DJ 21.10.2003; e SS no 2.465/SC, Rel. Nelson Jobim, DJ 20.10.2004.

No presente caso, reconheço que a controvérsia instaurada na ação em apreço evidencia a existência de matéria constitucional: alegação de ofensa aos arts. 2º, 6º, caput, 167, 196 e 198 da Constituição. Destaco que a suspensão da execução de ato
judicial constitui medida excepcional, a ser deferida, caso a caso, somente quando atendidos os requisitos autorizadores (grave lesão à ordem, à saúde, à segurança ou à economia públicas). Neste sentido, confira-se trecho de decisão proferida pela Ministra Ellen Gracie no julgamento da STA n o 138/RN: "[...] os pedidos de contracautela formulados em situações como a que ensejou a antecipação da tutela
ora impugnada devem ser analisados, caso a caso, de forma concreta, e não de forma abstrata e genérica, certo, ainda, que as decisões proferidas em pedido de suspensão se restringem ao caso específico analisado, não se estendendo os seus efeitos e as suas razões a outros casos, por se tratar de medida tópica, pontual" – (STA n o 138/RN, Presidente Min. Ellen Gracie, DJ 19.9.2007).

Ressalte-se, não obstante, que, na análise do pedido de suspensão de decisão judicial, não é vedado ao Presidente do Supremo Tribunal Federal proferir um juízo mínimo de delibação a respeito das questões jurídicas presentes na ação principal, conforme tem entendido a jurisprudência desta Corte, da qual se destacam os seguintes julgados: SS-AgR n o 846/DF, Rel. Sepúlveda Pertence, DJ 8.11.1996 e SS-AgR no 1.272/RJ, Rel. Carlos Velloso, DJ 18.5.2001. O art. 4º da Lei n o 8.437/1992 c/c art. 1º da Lei 9.494/1997 autoriza o deferimento do pedido de suspensão da execução da tutela antecipada concedida nas ações movidas contra o Poder Público ou seus agentes, a requerimento da pessoa jurídica de direito público interessada, em caso de manifesto interesse público ou de flagrante ilegitimidade, e para evitar grave lesão à ordem, à saúde, à segurança e à economia públicas. A decisão liminar que o Estado de Alagoas busca suspender determinou que o Estado fornecesse o medicamento Mabthera (Rituximabe), 500Mg e 100Mg, à paciente Maria de Lourdes da Silva, com fundamento na aplicação imediata do direito fundamental social à saúde, na legislação do Sistema Único de Saúde e na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça.

A doutrina constitucional brasileira há muito se dedica à interpretação do artigo 196 da Constituição. Teses, muitas vezes antagônicas, proliferaram-se em todas as instâncias do Poder Judiciário e na seara acadêmica. Tais teses buscam definir se, como e em que medida o direito constitucional à saúde se traduz em um direito subjetivo público a prestações positivas do Estado, passível de garantia pela via judicial. As divergências doutrinárias quanto ao efetivo âmbito de proteção da norma constitucional do direito à saúde decorrem, especialmente, da natureza prestacional
desse direito e da necessidade de compatibilização do que se convencionou denominar de "mínimo existencial" e da "reserva do possível" ( Vorbehalt des Möglichen). Como tenho analisado em estudos doutrinários, os direitos fundamentais não contêm apenas uma proibição de intervenção ( Eingriffsverbote), expressando também um postulado de proteção ( Schutzgebote). Haveria, assim, para utilizar uma expressão de Canaris, não apenas uma proibição de excesso ( Übermassverbot), mas também uma proibição de proteção insuficiente ( Untermassverbot) (Claus-Wilhelm Canaris, Grundrechtswirkungen um Verhältnismässigkeitsprinzip in der richterlichen Anwendung und Fortbildung des Privatsrechts , JuS, 1989, p. 161.). Nessa dimensão objetiva, também assume relevo a perspectiva dos direitos à organização e ao procedimento ( Recht auf Organization und auf Verfahren), que são aqueles direitos fundamentais que dependem, na sua realização, de providências estatais com vistas à criação e conformação de órgãos e procedimentos indispensáveis à sua efetivação. Ressalto, nessa perspectiva, as contribuições de Stephen Holmes e Cass Sunstein para o reconhecimento de que todas as dimensões dos direitos fundamentais têm custos públicos, dando significativo relevo ao tema da "reserva do possível", especialmente ao evidenciar a "escassez dos recursos" e a necessidade de se fazer escolhas alocativas, concluindo, a partir da perspectiva das finanças públicas, que "levar a sério os direitos significa levar à sério a escassez" (HOLMES, Stephen; SUNSTEIN, Cass. The Cost of Rights: Why Liberty Depends on Taxes . W. W. Norton & Company: Nova Iorque, 1999.).

Embora os direitos sociais, assim como os direitos e liberdades individuais, impliquem tanto direitos a prestações em sentido estrito (positivos), quanto direitos de defesa (negativos), e ambas as dimensões demandem o emprego de recursos públicos para a sua garantia, é a dimensão prestacional (positiva) dos direitos sociais o principal argumento contrário à sua judicialização. A dependência de recursos econômicos para a efetivação dos direitos de caráter social leva parte da doutrina a defender que as normas que consagram tais direitos assumem a feição de normas programáticas, dependentes, portanto, da formulação de políticas públicas para se tornarem exigíveis. Nesse sentido, também se defende que a intervenção do Poder Judiciário, ante a omissão estatal quanto à construção satisfatória dessas políticas, violaria o princípio da separação dos poderes e o princípio da reserva do financeiramente possível. Em relação aos direitos sociais, é preciso levar em consideração que a prestação devida pelo Estado varia de acordo com a necessidade específica de cada cidadão. Assim, enquanto o Estado tem que dispor de um valor determinado para arcar com o aparato capaz de garantir a liberdade dos cidadãos universalmente, no caso de um direito social como a saúde, por outro lado, deve dispor de valores variáveis em função das necessidades individuais de cada cidadão. Gastar mais recursos com uns do que com outros envolve, portanto, a adoção de critérios distributivos para esses recursos. Assim, em razão da inexistência de suportes financeiros suficientes para a satisfação de todas as necessidades sociais, enfatiza-se que a formulação das políticas sociais e econômicas voltadas à implementação dos direitos sociais implicaria, invariavelmente, escolhas alocativas. Tais escolhas seguiriam critérios de justiça distributiva (o quanto disponibilizar e a quem atender), configurando-se como típicas opções políticas, as quais pressupõem "escolhas trágicas" pautadas por critérios de
macro-justiça. É dizer, a escolha da destinação de recursos para uma política e não para outra leva em consideração fatores como o número de cidadãos atingidos pela política eleita, a efetividade e eficácia do serviço a ser prestado, a maximização dos resultados, etc. Nessa linha de análise, argumenta-se que o Poder Judiciário, o qual estaria vocacionado a concretizar a justiça do caso concreto (micro-justiça), muitas vezes não teria condições de, ao examinar determinada pretensão à prestação de um direito social, analisar as conseqüências globais da destinação de recursos públicos em benefício da parte com invariável prejuízo para o todo (AMARAL, Gustavo.
Direito, Escassez e Escolha . Renovar: Rio de Janeiro, 2001).

Por outro lado, defensores da atuação do Poder Judiciário na concretização dos direitos sociais, em especial do direito à saúde, argumentam que tais direitos são indispensáveis para a realização da dignidade da pessoa humana. Assim, ao menos o "mínimo existencial" de cada um dos direitos, exigência lógica do princípio da dignidade da pessoa humana, não poderia deixar de ser objeto de apreciação judicial. O fato é que o denominado problema da "judicialização do direito à saúde" ganhou tamanha importância teórica e prática que envolve não apenas os operadores do direito, mas também os gestores públicos, os profissionais da área de saúde e a sociedade civil como um todo. Se, por um lado, a atuação do Poder Judiciário é fundamental para o exercício efetivo da cidadania, por outro, as decisões judiciais têm significado um forte ponto de tensão perante os elaboradores e executores das políticas públicas, que se vêem compelidos a garantir prestações de direitos sociais das mais diversas, muitas vezes contrastantes com a política estabelecida pelos governos para a área de saúde e além das possibilidades orçamentárias.

Lembro, nesse ponto, a sagaz assertiva do professor Canotilho segundo a qual "paira sobre a dogmática e teoria jurídica dos direitos econômicos, sociais e culturais a carga metodológica da vaguidez, indeterminação e impressionismo que a teoria da ciência vem apelidando, em termos caricaturais, sob a designação de 'fuzzismo' ou 'metodologia fuzzy'". "Em toda a sua radicalidade – enfatiza Canotilho – a censura de fuzzysmo lançada aos juristas significa basicamente que eles não sabem do que estão a falar quando abordam os complexos problemas dos direitos econômicos, sociais e culturais" (CANOTILHO, J. J. Gomes. Metodologia "fuzzy" e "camaleões normativos" na problemática actual dos direitos econômicos, sociais e
culturais. In: Estudos sobre direitos fundamentais. Coimbra: Coimbra Editora, 2004, p. 100.).

Nesse aspecto, não surpreende o fato de que a problemática dos direitos sociais tenha sido deslocada, em grande parte, para as teorias da justiça, as teorias da argumentação e as teorias econômicas do direito (CANOTILHO, op. cit. , p. 98). Enfim, como enfatiza Canotilho, "havemos de convir que a problemática jurídica dos direitos sociais se encontra hoje numa posição desconfortável" (CANOTILHO, op. cit.
, p. 99). De toda forma, parece sensato concluir que, ao fim e ao cabo, problemas concretos deverão ser resolvidos levando-se em consideração todas as perspectivas que a questão dos direitos sociais envolve. Juízos de ponderação são inevitáveis nesse contexto prenhe de complexas relações conflituosas entre princípios e diretrizes políticas ou, em outros termos, entre direitos individuais e bens coletivos.

Alexy segue linha semelhante de conclusão ao constatar a necessidade de um modelo que leve em conta todos os argumentos favoráveis e contra os direitos sociais, da seguinte forma: "Considerando os argumentos contrários e favoráveis aos direitos fundamentais sociais, fica claro que ambos os lados dispõem de argumentos de peso. A solução consiste em um modelo que leve em consideração tanto os argumentos a favor quantos os argumentos contrários. Esse modelo é a expressão da idéia-guia formal apresentada anteriormente, segundo a qual os direitos fundamentais da Constituição alemã são posições que, do ponto de vista do direito constitucional, são tão importantes que a decisão sobre garanti-las ou não garanti-las não pode ser simplesmente deixada para a maioria parlamentar. (...) De acordo com essa fórmula, a questão acerca de quais direitos fundamentais sociais o indivíduo definitivamente tem é uma questão de sopesamento entre princípios. De um lado está, sobretudo, o princípio da liberdade fática. Do outro lado estão os princípios formais da competência decisória do legislador democraticamente legitimado e o princípio da separação de poderes, além de princípios materiais, que dizem respeito sobretudo à liberdade à liberdade jurídica de terceiros, mas também a outros direitos fundamentais sociais e a interesses coletivos." (ALEXY, Robert. Teoria dos Direitos Fundamentais. Tradução Virgílio Afonso da Silva. São Paulo: Malheiros Editores, 2008, p. 511-512) Ressalte-se, não obstante, que a questão dos
direitos fundamentais sociais enfrenta desafios no direito comparado que não se apresentam em nossa realidade. Isso porque a própria existência de direitos fundamentais sociais é questionada em países cujas Constituições não os prevêem de maneira expressa ou não lhes atribuem eficácia plena. É o caso da Alemanha, por exemplo, cuja Constituição Federal praticamente não contém direitos fundamentais de maneira expressa (ALEXY, Robert. Teoria dos Direitos Fundamentais. Tradução Virgílio Afonso da Silva. São Paulo: Malheiros Editores, 2008, p. 500), e de Portugal, que diferenciou o regime constitucional dos direitos, liberdades e garantias do regime constitucional dos direitos sociais (ANDRADE, José Carlos Vieira de. Os Direitos Fundamentais na Constituição Portuguesa de 1976. 3ª Edição. Coimbra: Almedina, 2004, p. 385).

A Constituição brasileira não só prevê expressamente a existência de direitos fundamentais sociais (artigo 6º), especificando seu conteúdo e forma de prestação (artigos 196, 201, 203, 205, 215, 217, entre outros), como não faz distinção entre os direitos e deveres individuais e coletivos (capítulo I do Título II) e os direitos sociais (capítulo II do Título II), ao estabelecer que os direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata (artigo 5º, § 1º, CF/88). Vê-se, pois, que os direitos fundamentais sociais foram acolhidos pela Constituição Federal de 1988 como autênticos direitos fundamentais. Não há dúvida – deixe-se claro – que as demandas que buscam a efetivação de prestações de saúde devem ser resolvidas a partir da análise de nosso contexto constitucional e de suas peculiaridades. Portanto, ante a impreterível necessidade de ponderações, são as circunstâncias específicas de cada caso que serão decisivas para a solução da controvérsia. Há que se partir, de toda forma, do texto constitucional e de como ele consagra o direito fundamental à saúde.

Passo então a algumas considerações a respeito do tema. O direito à saúde é estabelecido pelo artigo 196 da Constituição Federal como (1) "direito de todos" e (2) "dever do Estado", (3) garantido mediante "políticas sociais e econômicas (4) que visem à redução do risco de doenças e de outros agravos", (5) regido pelo princípio do "acesso universal e igualitário" (6) "às ações e serviços para a sua promoção, proteção e recuperação". Examinemos cada um desses elementos.

(1) direito de todos: É possível identificar na redação do artigo constitucional tanto um direito individual quanto um direito coletivo à saúde. Dizer que a norma do artigo 196,
por tratar de um direito social, consubstancia-se tãosomente em norma programática, incapaz de produzir efeitos, apenas indicando diretrizes a serem observadas pelo poder público, significaria negar a força normativa da Constituição.
A dimensão individual do direito à saúde foi destacada pelo Ministro Celso de Mello, relator do AgR-RE nº 271.286-8/RS, ao reconhecer o direito à saúde como um direito público subjetivo assegurado à generalidade das pessoas, que conduz o indivíduo e o Estado a uma relação jurídica obrigacional. Ressaltou o Ministro que "a interpretação da norma programática não pode transformá-la em promessa constitucional inconseqüente", impondo aos entes federados um dever de prestação positiva. Concluiu que "a essencialidade do direito à saúde fez com que o legislador constituinte qualificasse como prestações de relevância pública as ações e serviços de saúde (CF, art. 197)", legitimando a atuação do Poder Judiciário nas hipóteses em que a Administração Pública descumpra o mandamento constitucional em apreço. (AgR-RE N. 271.286- 8/RS, Rel. Celso de Mello, DJ 12.09.2000). Não obstante, esse direito subjetivo público é assegurado mediante políticas sociais e econômicas. Ou seja, não há um direito absoluto a todo e qualquer procedimento necessário para a proteção, promoção e recuperação da saúde, independentemente da existência de uma política pública que o concretize. Há um direito público subjetivo a políticas públicas que promovam, protejam e recuperem a saúde. Em decisão proferida na ADPF nº 45/DF, o Min. Celso de Mello consignou o seguinte: "Desnecessário acentuar-se, considerando o encargo governamental de tornar efetiva a aplicação dos direitos econômicos, sociais e culturais, que os elementos componentes do mencionado binômio (razoabilidade da pretensão + disponibilidade financeira do Estado) devem configurar-se de modo afirmativo e em situação de cumulativa ocorrência, pois, ausentes qualquer desses elementos, descaracterizar-se-á a possibilidade estatal de realização prática de tais direitos".(ADPF-MC Nº 45, Rel. Celso de Mello, DJ 4.5.2004). Dessa forma, a garantia judicial da prestação individual de saúde, prima facie, estaria condicionada ao não comprometimento do funcionamento do Sistema Único de Saúde.

(2) dever do Estado: O dispositivo constitucional deixa claro que, para além do direito fundamental à saúde, há o dever fundamental de prestação de saúde por parte do Estado (União, Estados, Distrito Federal e Municípios). O dever de desenvolver políticas públicas que visem à redução de doenças, à promoção, à proteção e à recuperação da saúde está expresso no artigo 196. A competência comum dos entes da federação para cuidar da saúde consta do art. 23, II, da Constituição. União, Estados, Distrito Federal e Municípios são responsáveis solidários pela saúde junto ao indivíduo e à coletividade e, dessa forma, são legitimados passivos nas demandas cuja causa de pedir é a negativa, pelo SUS (seja pelo gestor municipal, estadual ou federal), de prestações na área de saúde. O fato do Sistema Único de Saúde ter descentralizado os serviços e conjugado os recursos financeiros dos entes da federação, com o objetivo de aumentar a qualidade e o acesso aos serviços de saúde, apenas reforça a obrigação solidária e subsidiária entre eles. As ações e serviços de saúde são de relevância pública, integrantes de uma rede regionalizada e hierarquizada, segundo o critério da subsidiariedade, e constituem um sistema único. Foram estabelecidas quatro diretrizes básicas para as ações de saúde: direção administrativa única em cada nível de governo; descentralização políticoadministrativa; atendimento integral, com preferência para as atividades preventivas; e participação da comunidade. O Sistema Único de Saúde está baseado no financiamento público e na cobertura universal das ações de saúde. Dessa forma, para que o Estado possa garantir a manutenção do sistema é necessário que se atente para a estabilidade dos gastos com a saúde e, conseqüentemente, para a captação de recursos. O financiamento do Sistema Único de Saúde, nos termos do art. 195, opera-se com recursos do orçamento da seguridade social, da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, além de outras fontes. A Emenda Constitucional nº 29/2000, visando a dar maior estabilidade para os recursos de saúde, consolidou um mecanismo de cofinanciamento das políticas de saúde pelos entes da federação. A Emenda acrescentou dois novos parágrafos ao artigo 198 da Constituição, assegurando percentuais mínimos a serem destinados pela União, Estados, Distrito Federal e Municípios para a saúde, visando um aumento e uma maior estabilidade dos recursos. No entanto, o § 3º do art. 198 dispõe que caberá à Lei Complementar estabelecer: os percentuais mínimos de que trata o § 2º; os critérios de rateio entre os entes; as normas de fiscalização, avaliação e controle das despesas com saúde; as normas de cálculo do montante a ser aplicado pela União; além, é claro, de especificar as ações e serviços públicos de saúde. O art. 200 da Constituição, que estabeleceu as competências do Sistema Único de Saúde - SUS, é regulamentado pelas Leis Federais 8.080/90 e 8.142/90. O SUS consiste no conjunto de ações e serviços de saúde, prestados por órgãos e instituições públicas
federais, estaduais e municipais, da Administração direta e indireta e das fundações mantidas pelo Poder Público, incluídas as instituições públicas federais, estaduais e
municipais de controle de qualidade, pesquisa e produção de insumos, medicamentos, inclusive de sangue e hemoderivados, e de equipamentos para saúde.

(3) garantido mediante políticas sociais e econômicas: A garantia mediante políticas sociais e econômicas ressalva, justamente, a necessidade de formulação de políticas públicas que concretizem o direito à saúde através de escolhas alocativas. É incontestável que, além da necessidade de se distribuir recursos naturalmente escassos por meio de critérios distributivos, a própria evolução da medicina impõe um viés programático ao direito à saúde, pois sempre haverá uma nova descoberta,
um novo exame, um novo prognóstico ou procedimento cirúrgico, uma nova doença ou a volta de uma doença supostamente erradicada.

(4) políticas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos: Tais políticas visam à redução do risco de doença e outros agravos, de forma a evidenciar sua dimensão preventiva. As ações preventivas na área da saúde foram, inclusive, indicadas como prioritárias pelo artigo 198, inciso II, da Constituição.

(5) políticas que visem ao acesso universal e igualitário: O constituinte estabeleceu, ainda, um sistema universal de acesso aos serviços públicos de saúde. Nesse sentido, a Ministra Ellen Gracie, na STA 91, ressaltou que, no seu entendimento, o art. 196 da Constituição refere-se, em princípio, à efetivação de políticas públicas que alcancem a população como um todo (STA 91-1/AL, Ministra Ellen Gracie, DJ 26.02.2007). O princípio do acesso igualitário e universal reforça a responsabilidade solidária dos entes da federação, garantindo, inclusive, a "igualdade da assistência à saúde, sem preconceitos ou privilégios de qualquer espécie" (art. 7º, IV, da Lei 8.080/90).

(6) ações e serviços para promoção, proteção e recuperação da saúde: O estudo do direito à saúde no Brasil leva à concluir que os problemas de eficácia social desse direito fundamental devem-se muito mais a questões ligadas à implementação e manutenção das políticas públicas de saúde já existentes - o que implica também a composição dos orçamentos dos entes da federação - do que à falta de legislação específica. Em outros termos, o problema não é de inexistência, mas de execução (administrativa) das políticas públicas pelos entes federados. Nessa perspectiva, talvez seja necessário redimensionar a questão da judicialização dos direitos sociais no Brasil. Isso porque, na maioria dos casos, a intervenção judicial não ocorre tendo em vista uma omissão (legislativa) absoluta em matéria de políticas públicas voltadas à proteção do direito à saúde, mas em razão de uma necessária determinação judicial para o cumprimento de políticas já estabelecidas. Portanto, não se cogita do problema da interferência judicial em âmbitos de livre apreciação ou de ampla discricionariedade de outros poderes quanto à formulação de políticas públicas. Esse dado pode ser importante para a construção de um critério ou parâmetro para a decisão em casos como este, no qual se discute, primordialmente, o problema da interferência do Poder Judiciário na esfera dos outros Poderes. O primeiro dado a ser considerado é a existência, ou não, de política estatal que abranja a prestação de saúde pleiteada pela parte no processo. Ao deferir uma prestação de saúde incluída entre as políticas sociais e econômicas formuladas pelo Sistema Único de Saúde, o judiciário não está criando política pública, mas apenas determinando o seu cumprimento. Nesses casos, a existência de um direito subjetivo público a determinada política pública de saúde parece ser evidente. Se a prestação de saúde pleiteada não for abrangida pelas políticas do SUS, é imprescindível distinguir se a não-prestação decorre de uma omissão legislativa ou administrativa, ou de uma decisão administrativa de não fornecer. Nesses casos, a ponderação dos princípios em conflito dará a resposta ao caso concreto. Importante, no entanto, que os critérios de justiça comutativa que orientam a decisão judicial sejam compatibilizados com os critérios das justiças distributiva e social que determinam a elaboração de políticas públicas. Em outras palavras, ao determinar o fornecimento de um serviço de saúde (internação hospitalar, cirurgia, medicamentos, etc.), o julgador precisa assegurar-se de que o Sistema de Saúde possui condições de arcar não só com as despesas da parte, mas também com as despesas de todos os outros cidadãos que se encontrem em situação idêntica.

Essas considerações já são suficientes para a análise do pedido. Dos documentos acostados aos autos, ressalto os seguintes dados fáticos como imprescindíveis para a análise do pleito:

a) "a requerente é portadora de Leucemia Linfocítica Crônica – CID C91.1, conforme se vê do relatório médico firmado pela Dra. Ana Lúcia Rego de Oliveira Barros, CRM-AL nº 2697" (fl. 20);

b) conforme receituário médico, necessita urgentemente do tratamento quimioterápico de doze ciclos (infusão de 05 horas a cada 60 dias) com os medicamentos Mabthera 500Mg (12 frascos) e Mabthera 100Mg (24 frascos) (fls. 20-21);

c) a requerente alega não ter condições de arcar com o alto custo do tratamento, orçado em R$ 162.707,16 (fl. 21).

O argumento central apontado pelo Estado de Alagoas reside na ausência de obrigação legal para que o Estado forneça o serviço requerido. Sustenta caber ao Município de Maceió a prestação de saúde requerida. No RE 195.192-3/RS, a 2ª Turma deste Supremo Tribunal consignou o entendimento segundo o qual a responsabilidade pelas ações e serviços de saúde é da União, dos Estados e do Distrito Federal e dos Municípios. Nesse sentido, o acórdão restou assim ementado:
"SAÚDE – AQUISIÇÃO E FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS – DOENÇA RARA. Incumbe ao Estado (gênero) proporcionar meios visando a alcançar a saúde, especialmente quando envolvida criança e adolescente. O Sistema Único de Saúde torna a responsabilidade linear alcançando a União, os Estados, o Distrito Federal e
os Municípios." (RE 195.192-3/RS, 2ª Turma, Ministro Marco Aurélio, DJ 22.02.2000). Em sentido idêntico, no RE-AgR 255.627-1, o Ministro Nelson Jobim afastou a alegação do Município de Porto Alegre de que não seria responsável pelos serviços de saúde de alto custo. O Ministro Nelson Jobim, amparado no precedente do RE 280.642, no qual a 2ª Turma havia decidido questão idêntica, negou provimento ao Agravo Regimental do Município: "(...) A referência, contida no preceito, a "Estado" mostra-se abrangente, a alcançar a União Federal, os Estados propriamente ditos, o Distrito Federal e os Municípios. Tanto é assim que, relativamente ao Sistema Único de Saúde, diz-se do financiamento, nos termos do artigo nº 195, com recursos do orçamento, da seguridade social, da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, além de outras fontes. Já o caput do artigo informa, como diretriz, a descentralização das ações e serviços públicos de saúde que devem integrar rede regionalizada e hierarquizada, com direção única em cada esfera de governo. Não bastasse o parâmetro constitucional de eficácia imediata, considerada a natureza, em si, da atividade, afigura-se como fato incontroverso, porquanto registrada, no acórdão recorrido, a existência de lei no sentido da obrigatoriedade de fornecer-se os medicamentos excepcionais, como são os concernentes à Síndrome da Imunodeficiência Adquirida (SIDA/AIDS), às pessoas carentes. O município de Porto Alegre surge com responsabilidade prevista em diplomas específicos, ou seja, os convênios celebrados no sentido da implantação do Sistema Único de Saúde, devendo receber, para tanto, verbas do Estado. Por outro lado, como bem assinalado no acórdão, a falta de regulamentação municipal para o custeio da distribuição não impede fique assentada a responsabilidade do Município. (...)" (RE-AgR 255.627-1/RS, 2ª Turma, Ministro Nelson Jobim, DJ 21.11.2000)

Assim, apesar da responsabilidade dos entes da federação em matéria de direito à saúde suscitar questões delicadas, a decisão impugnada, ao determinar a responsabilidade do Estado no fornecimento do tratamento pretendido, segue as normas constitucionais que fixaram a competência comum (art. 23, II, da CF), a Lei Federal nº 8.080/90 (art. 7º, XI) e a jurisprudência desta Corte. Entendo, pois, que a determinação para que o Estado de Alagoas arque com as despesas do tratamento não configura lesão à ordem pública. Registre-se que a Lei Federal Nº 6.360/76, ao dispor sobre a Vigilância Sanitária a que ficam sujeitos os Medicamentos, as Drogas, os Insumos Farmacêuticos e Correlatos, determina em seu artigo 12 que "nenhum dos produtos de que trata esta Lei, inclusive os importados, poderá ser industrializado, exposto à venda ou entregue ao consumo antes de registrado no Ministério da Saúde" 

Em consulta ao sítio da ANVISA na internet, é possível verificar que o medicamento Mabthera (princípio ativo Rixuximabe), produzido pela empresa PRODUTOS ROCHE QUÍMICOS E FARMACÊUTICOS S.A., foi registrado em 7.2.2001 (registro 101000548, válido até 06/2013). A decisão objeto do pedido de suspensão, ao determinar o fornecimento do medicamento Mabhtera, decidiu pelo fornecimento de medicamento de alto custo que não consta dos protocolos do SUS. Discute-se, no caso, o direito à saúde como direito ao fornecimento de quimioterápico de alto custo para o tratamento de neoplasia (leucemia linfocítica crônica). A Portaria nº 3916, de 30 de outubro de 1998, dispõe sobre a Política Nacional de Medicamentos, estabelecendo diretrizes para a instituição de relação de medicamentos essenciais (RENAME), a regulamentação sanitária de medicamentos, a reorientação da assistência farmacêutica, a promoção da pesquisa e da produção de medicamentos, entre outras. A assistência farmacêutica (Resolução nº 338/2004 do Conselho Nacional de Saúde), uma dentre as várias prestações de saúde que compõem o sistema brasileiro, abrange políticas econômicas que visam reduzir os preços dos medicamentos (programas como "Farmácia Popular", "Medicamento Genérico" e "Uso Racional de Medicamentos") e políticas sociais que garantam o fornecimento gratuito de medicamentos à população por meio de três programas básicos ("Medicamentos básicos", "Medicamentos estratégicos" e "Medicamentos excepcionais").

A Portaria nº 2.439/GM, de 8 de dezembro de 2005, instituiu a Política Nacional de Atenção Oncológica, traçando diretrizes para promoção, prevenção, diagnóstico, tratamento, reabilitação e cuidados paliativos a serem implantadas pelos órgãos do SUS. Dentro desta Política Nacional, a Portaria Nº 741/GM, 19 de dezembro de 2005, define as "unidades de assistência de alta complexidade em oncologia", os "centros de assistência de alta complexidade em oncologia" (CACON) e os "Centros de Referência de alta complexidade em oncologia", especificando os procedimentos que podem realizar e as normas para se credenciarem no Programa.

As instituições credenciadas ao Sistema Único de Saúde escolhem os fármacos necessários à quimioterapia ou aos outros procedimentos que julguem adequados para o tratamento do paciente e, posteriormente, requerem ao SUS o ressarcimento do valor gasto. A Portaria nº 146/MS-SAS, de 12 de março de 2008, estabelece os códigos e os valores máximos por procedimento que as Instituições de alta complexidade em oncologia poderão reaver. Na hipótese dos autos, o medicamento requerido, por ter um custo muito elevado, não se enquadra dentro dos limites de valores para tratamento quimioterápico transferidos pelo SUS para as instituições conveniadas. Em razão disso, a autora ajuizou ação ordinária buscando a condenação do Estado de Alagoas no fornecimento do medicamento Mabthera (Rituximabe).

Não vislumbro na decisão impugnada risco de grave lesão à ordem pública, uma vez considerados os seguintes dados fáticos:

- o medicamento Mabthera está registrado na ANVISA, o que atesta sua segurança para o consumo; - consta dos autos que a paciente é portadora de Leucemia Linfocítica Crônica (CID C 91.1), conforme atestado pela Médica Ana Lúcia Rego de Oliveira (CRM-AL 2697), necessitando com urgência do tratamento quimioterápico de doze ciclos consecutivos com Mabthera 500Mg e 100Mg;

- a requerente declara não possuir condições de arcar com o custo do tratamento, orçado em R$ 162.707,16 (cento e sessenta e dois mil, setecentos e sete reais e dezesseis centavos) mensais;

- o alto custo do medicamento não é, por si só, motivo para o seu não fornecimento, visto que a Política de Dispensação de Medicamentos excepcionais e a Política Nacional de Atenção Oncológica visam contemplar justamente o acesso da população acometida por neoplasias aos tratamentos disponíveis.

O Estado de Alagoas, apesar de alegar grave lesão à economia estadual, não comprova a ocorrência da lesão, limitando-se a sustentar que o Município de Maceió é que deveria ser responsabilizado pelo fornecimento. Assim, inocorrentes os pressupostos contidos no art. 4º da Lei n o 8.437/1992, verifico que a ausência do medicamento solicitado poderá ocasionar graves e irreparáveis danos à saúde e à vida da paciente. Ressalte-se, ainda, que a alegação de violação à separação dos Poderes não justifica a inércia do Poder Executivo em cumprir seu dever constitucional de garantia do direito à saúde (art. 196), legalmente estabelecido pelas normas que regem o Sistema Único de Saúde.

Quanto à possibilidade de intervenção do Poder Judiciário, destaco a ementa da decisão proferida na ADPFMC 45/DF, relator Celso de Mello, DJ 29.4.2004: "EMENTA: ARGUIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENTAL. A QUESTÃO DA LEGITIMIDADE CONSTITUCIONAL DO CONTROLE E DA INTERVENÇÃO DO PODER JUDICIÁRIO EM TEMA DE IMPLEMENTAÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS, QUANDO CONFIGURADA HIPÓTESE DE ABUSIVIDADE GOVERNAMENTAL. DIMENSÃO POLÍTICA DA JURISDIÇÃO CONSTITUCIONAL ATRIBUÍDA AO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. INOPONIBILIDADE DO ARBÍTRIO ESTATAL À EFETIVAÇÃO DOS DIREITOS SOCIAIS, ECONÔMICOS E CULTURAIS. CARÁCTER RELATIVO DA LIBERDADE DE CONFORMAÇÃO DO LEGISLADOR. CONSIDERAÇÕES EM TORNO DA CLÁUSULA DA 'RESERVA DO POSSÍVEL'. NECESSIDADE DE PRESERVAÇÃO, EM FAVOR DOS INDIVÍDUOS, DA INTEGRIDADE E DA INTANGIBILIDADE DO NÚCLEO CONSUBSTANCIADOR DO 'MÍNIMO EXISTENCIAL'. VIABILIDADE INSTRUMENTAL DA ARGÜIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO NO PROCESSO DE CONCRETIZAÇÃO DAS LIBERDADES POSITIVAS (DIREITOS CONSTITUCIONAIS DE
SEGUNDA GERAÇÃO)." Nesse sentido é a lição de Christian Courtis e Victor Abramovich (ABRAMOVICH, Victor; COURTS, Christian, Los derechos sociales como derechos exigibles , Trotta, 2004, p. 251): "Por ello, el Poder Judicial no tiene la tarea de diseñar políticas públicas, sino la de confrontar el diseño de políticas asumidas con los estándares jurídicos aplicables y – en caso de hallar divergencias – reenviar la cuestión a los poderes pertinentes para que ellos reaccionen ajustando su actividad en consecuencia. Cuando las normas constitucionales o legales fijen pautas para el diseño de políticas públicas y los poderes respectivos no hayan adoptado ninguna medida, corresponderá al Poder Judicial reprochar esa omisión y reenviarles la cuestión para que elaboren alguna medida. Esta dimensión de la actuación judicial puede ser conceptualizada como la participación en un <<diálogo>> entre los distintos poderes del Estado para la concreción del programa jurídico-político establecido por la constitución o por los pactos de derechos humanos." (sem grifo no original) Portanto, o fornecimento do medicamento Mabthera (Rituximabe) a paciente portadora de Leucemia Linfocítica Crônica (CID C91.1), na hipótese dos autos, não representa lesão à ordem pública. A decisão que determinou ao Estado de Alagoas o seu fornecimento, se suspensa, poderá acarretar dano irreparável para a autora. Assim, não é possível vislumbrar grave ofensa à ordem, à saúde, à segurança ou à economia públicas a ensejar a adoção da medida excepcional de suspensão de tutela antecipada.

Ante o exposto,

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