Reflexões sobre a Possibilidade do Ingresso de Ação de Investigação de Paternidade em favor de Nascituro
Roberta Madeira Quaranta é Defensora Pública do Estado do Ceará e mestranda em Direito Constitucional pela Universidade de Fortaleza ? UNIFOR e Paulo Antônio Coêlho dos Santos é Advogado e ex-estagiário da DPG/CE.
Muito se tem questionado acerca da possibilidade de um nascituro figurar no pólo ativo na Ação de Investigação de Paternidade cumulada com Pedido de Alimentos. Conhecida e complexa é, antes de tudo, a discussão sobre a personalidade do nascituro, especialmente no que diz respeito ao teor do texto do artigo 4º do Código Civil de 1916, que foi praticamente repetido no texto do artigo 2º do novel Código Civil, que assim dispõe: “Art. 2º A personalidade civil da pessoa começa do nascimento com vida; mas a lei põe a salvo, desde a concepção, os direitos do nascituro”.
A Ação de Investigação de Paternidade cumulada com Alimentos encontra seu fundamento legal no § 6º do art. 227 da Magna Carta, assim como na Lei n° 8.560/92 (Lei de Investigação de Paternidade), c/c o art. 26 da Lei nº. 8.069/90 – Estatuto da Criança e do Adolescente, com o art. 1.616 do Código Civil Brasileiro, bem como no art. 292 do Código de Processo Civil Pátrio.
Ainda que as correntes doutrinárias que tratam do início da personalidade natural (natalista; da personalidade condicional ou concepcionista) sejam divergentes, no que se refere à natureza jurídica do nascituro, não existem maiores problemáticas sobre a acepção desta palavra. Não há o que se questionar acerca de serem os nascituros seres humanos, entes que, ainda que vivendo intra-uterinamente, foram gerados por seres humanos. Certo é que, sendo o “conceptus” um ente concebido, independente da evidência do nascimento, enquanto no útero estiver, é um nascituro.
Mais do que isso, ninguém discute que o nascituro tenha direito à vida, e não mera expectativa, uma vez que "Independentemente de se reconhecer o atributo da personalidade jurídica, o fato é que seria um absurdo resguardar direitos desde o surgimento da vida intra-uterina se não se autorizasse a proteção do nascituro – direito à vida – para que justamente pudesse usufruir tais direitos". (GAGLIANO-PAMPLONA, 2002, p.93).
Inequívoco, portanto, que os dispositivos legais acima mencionados, interpretados sistematicamente em meio ao ordenamento jurídico, ao tratarem da proteção integral à criança, direito à filiação, garantias de prestações materiais básicas decorrentes das relações de parentesco, dentre outras coisas, também incluíram os nascituros no rol dos destinatários de suas normas protetivas.
Na verdade, a vida começa não com a gestação, mas com a fecundação. Desde o momento da hibernação do embrião, há vida, embora em estado latente, ou, como alguns referem, há um pré-embrião. E a lei protege a vida desde o seu início, eis o entendimento do Código Civil Brasileiro, que têm como base maior o artigo o art. 226 da Carta Política de 1988, informando que a família é base da sociedade e tem especial proteção do Estado.
De certo a legislação não atribuiu personalidade plena ao nascituro para postular. Embora haja quem sufrague o contrário, trata-se de uma situação que somente se aproxima da personalidade. Esta só advém do nascimento com vida. Todavia, seria ilógico tolher a representação materna que tenha intuito de garantir a subsistência e salvaguarda dos direitos do nascituro.
O entendimento dos tribunais é uníssono no sentido de que a mãe goza de plena legitimidade para representar o nascituro em Investigação de Paternidade: "Nascituro. Investigação de Paternidade. A genitora, como representante do nascituro, tem legitimidade para propor ação investigatória de paternidade. Apelo provido". (TJRS, 7ª Câmara Cível, Apelação Cível nº. 70000134635, rel. Des. Maria Berenice Dias, j. 17.11.99). (Negritos Inovados).
Stolze Gagliano e Pamplona Filho aduzem que o nascituro deve fazer jus a alimentos, "por não ser justo que a genitora suporte todos os encargos da gestação sem a colaboração econômica do seu companheiro reconhecido" (GAGLIANO-PAMPLONA, 2002, p.943).
Assim, exatamente por se tratar de um ser que luta para nascer com vida, faz-se necessária também a fixação de alimentos, caso haja indícios veementes da paternidade objeto de investigação judicial. Nesse caso, os alimentos, provisionais, devem ser deferidos com base no art. 852, III, do CPC, e se revertem de atenção especial, sob pena de ver inviável o direito requerido, porquanto, têm eles, como objetivo fundamental, promover o perfeito desenvolvimento do nascituro na pendência da lide, coadunando-se perfeitamente com os pressupostos necessários para concessão das medidas acautelatórias, quais sejam, “fumus boni júris” e “periculum in mora”.
Assim sendo, havendo necessidade por parte da gestante, faz-se imprescindível o resguardo das expectativas de direitos do nascituro, expectativas estas que só poderão transmudar-se em direitos concretos, efetivos, caso lhe seja proporcionado o direito de nascer com vida, uma vez que os bens jurídicos protegidos na ação em comento (direito à filiação e a alimentos) são indisponíveis, cabendo à representante legal do nascituro zelar para que sejam devidamente realizados.
BIBLIOGRAFIA
FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda, Novo Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa, 3ª, ed., Curitiba: Positivo, 2004.
GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA Filho, Rodolfo. Novo Curso de Direito Civil. São Paulo: Saraiva, 2002.
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro, volume VI: Direito de Família. São Paulo: Saraiva, 2005.






