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Nº 025 - 18 de julho de 2019
José Almeida Júnior
Desde muito cedo, José Almeida já pensava em ser escritor, principalmente regionalista. Somente após ter entrado na Defensoria Pública do Distrito Federal, o defensor reviveu essa vontade de escrever. 
 
Em 2017, o livro "Última Hora" ganhou o Prêmio Sesc de Literatura. No ano seguinte, o livro foi finalista dos Prêmios Jabuti e São Paulo de Literatura. Já em junho, o defensor lançou outra obra "O Homem que Odiava Machado de Assis".
 
Para escrever as obras, Almeida, como é conhecido, se inspira em pessoas reais para pegar traços físicos e de personalidade. "Se é para indicar uma inspiração, eu diria que são as pessoas com quem eu tenho contato e estou sempre analisando para ver se elas cabem num livro".
 
Confira na íntegra a entrevista do defensor e escritor!
 

ANADEP - 
Há quanto tempo você é defensor público? Por que decidiu ingressar na carreira?

Estou na Defensoria Pública do Distrito Federal há 12 anos. A ideia de entrar na carreira surgiu em um momento em que as Defensorias Públicas de todo Brasil começavam a se estruturar e a ganhar autonomia. Como estudava o garantismo no Processo Penal, quis entrar na Defensoria Pública para tentar garantir uma defesa de qualidade aos réus que não tinham condições de pagar bons advogados. Depois mudei de área e atualmente trabalho em causas cíveis.

Hoje, além de ser defensor público, você também é escritor. Como surgiu este talento?

Desde jovem gostava de literatura. Lia bastante e desejava ser escritor. Como nordestino, queria seguir a tradição de um escritor regionalista. Durante a faculdade, deixei um pouco de lado esse desejo, mas sempre que podia encaixava um livro de literatura entre os jurídicos. Depois que entrei na Defensoria Pública, retomei a ideia de ser escritor. Fui amadurecendo aos poucos como leitor até que resolvi escrever um livro de ficção. Em 2017, meu livro “Última Hora” ganhou o Prêmio Sesc de Literatura. No ano seguinte, o livro foi finalista dos Prêmios Jabuti e São Paulo de Literatura. A partir daí, percebi que eu tinha algum talento.

Você foi premiado no Prêmio Sesc de Literatura, em 2017, na categoria de Melhor Romance com a obra "Última Hora". O que isso significa para você?

O Prêmio Sesc de Literatura é a principal premiação para autores estreantes. O ganhador é contratado por uma grande editora, que insere o autor no circuito nacional de literatura do Sesc. Então, ser ganhador do Prêmio Sesc significa começar uma carreira literária pelo andar de cima. Desde que recebi o prêmio já participei de mais de trinta eventos em todas as regiões do país. Inclusive, tive a oportunidade de fazer um circuito internacional em Portugal para falar do livro em bibliotecas, escolas e na Feira de Óbidos.

Premiação 

Como surgiu a ideia de escrever este livro? Qual a abordagem dele?
Minha área profissional é o Direito. Mas sempre tive duas outras grandes paixões: História e Literatura. Getúlio Vargas lançou as bases do trabalhismo brasileiro e influenciou o pensamento de esquerda de políticos como Jango, Brizola e Lula. Por outro lado, Vargas perseguiu comunistas e implantou uma ditadura violenta durante o Estado Novo. Tive a curiosidade de compreender o comportamento dos comunistas, que haviam sido perseguidos no Estado Novo, durante o governo democrático Vargas do início dos anos 50. Pesquisando o período, descobri que Samuel Wainer captou alguns comunistas para trabalhar na Última Hora, jornal criado para apoiar Getúlio Vargas. Era o personagem que eu estava procurando: um comunista torturado pela ditadura Vargas que foi trabalhar no jornal que iria apoiá-lo. Daí nasceu Marcos, o protagonista que narra o romance.
 
Por que escolheu escrever um Romance? É o seu gênero literário preferido?

Eu sempre gostei das narrativas longas. Como grande leitor de romance, naturalmente decidi me dedicar ao gênero. Mas eu já escrevi alguns contos. Recentemente, a Amazon e a minha agência literária me convidaram para escrever um conto, que foi lançado na Flip. Foi uma ótima experiência, porque aproveitei a narrativa curta para contar uma história familiar minha, ambientada no interior do Rio Grande do Norte. O nome do conto se chama Dindim, apelido de meu bisavô.

Você lançou, em junho, outra obra chamada "O Homem que Odiava Machado de Assis". Conte-nos mais sobre este livro!

A ideia do romance surgiu quando descobri um ponto obscuro na biografia de Carolina e Machado de Assis. Carolina Novais, com mais de trinta anos e solteira, mudou-se de Portugal para o Brasil na companhia de Artur Napoleão, músico reconhecidamente boêmio. O fato era incomum para a sociedade católica conservadora do século XIX. Posteriormente, ela se casou com Machado de Assis e Artur Napoleão foi um dos padrinhos. Mas o mistério aumentou quando Artur Napoleão deixou um livro de memórias e declarou que não poderia revelar as circunstâncias em que Carolina havia se mudado do Porto às pressas. Com base nesta lacuna na biografia de nosso escritor maior, construí um personagem de ficção, Pedro Junqueira, que vivia às turras com Machado. No meu romance, Pedro foi a causa da vinda de Carolina para o Brasil.

Quem ou o quê te inspira na hora de escrever?

O ofício da escrita às vezes é glamourizado. Escrever ficção exige muito mais disciplina do que inspiração. Mas, para compor personagem, às vezes me inspiro em pessoas reais para pegar traços físicos e de personalidade. Então, se é para indicar uma inspiração, eu diria que são as pessoas com quem eu tenho contato e estou sempre analisando para ver se elas cabem em um livro.

A literatura te ajuda de alguma forma no seu dia a dia de defensor?

Acho que a literatura é, acima de tudo, um exercício de empatia. Ou seja, tentar se colocar no lugar do outro. Seja como escritor, seja como leitor. Acho que a literatura me ajuda a me colocar na situação do assistido que procura os serviços da Defensoria Pública e entender suas necessidades e angústias.

Como você acha que projetos que envolvam livros e os(as) usuários(as) da DP podem auxiliar na construção de um indivíduo melhor?

Eu já pensei em formatar um projeto de biblioteca comunitária nos núcleos da Defensoria Pública. Diariamente recebemos centenas de pessoas, sobretudo hipossuficientes, com problemas jurídicos para resolver. Se os nossos assistidos pudessem sair da Defensoria Pública com um bom livro, acho que seria transformador para eles. Além de terem seu problema jurídico respondido, eles poderiam dar uma virada nas suas vidas através da leitura.

E, por fim, o que você acha que precisa ser feito para o fortalecimento da Defensoria Pública?

A Defensoria Pública precisa se portar cada vez mais como um agente de transformação social. A Defensoria não pode se restringir à atuação processual e fazer parte de um jogo de legitimação de um sistema jurídico, que, muitas vezes, é prejudicial aos hipossuficientes. Acho que o fortalecimento da Defensoria Pública passa pela atuação em demandas coletivas e pela participação ativa em políticas públicas em defesa dos mais pobres.

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