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Nº 26 - 10 de outubro de 2016
Rivana Ricarte
Primeira Defensora Pública Estadual indicada ao cargo de DPI (Defensora Pública Interamericana).

Natural da Paraíba, Rivana Ricarte de Oliveira é Defensora Pública no Acre, desde 2002. Com mestrado em Direitos Humanos e doutorado em andamento no mesmo tema, Rivana é a primeira Defensora Pública Estadual indicada para ocupar o cargo de Defensor Público Interamericano. Até hoje, o Brasil havia nomeado apenas homens para o cargo.

Rivana terá um mandato de três anos perante a Corte IDH e continuará a atuar normalmente na DPE do Acre. Segundo ela, antes de ser escolhida, em agosto de 2016, já havia participado de três certames.

Durante a entrevista, a Defensora Pública destaca a importância da participação da mulher no Sistema Interamericano de Direitos Humanos e do papel do DPI neste contexo. 

Confira abaixo a íntegra da entrevista.

"A mulher neste espaço é um diferencial porque traz à tona o debate da afirmação da mulher e de seus direitos humanos, ressaltando a construção de uma política institucional que dê privilégio a participação equitativa de homens e de mulheres."
ANADEP - 
A senhora é a primeira Defensora Pública Estadual indicada a ocupar o cargo de DPI no Sistema Interamericano de Proteção e Promoção dos Direitos Humanos (SIDH). Você considera que a presença de uma mulher neste trabalho pode trazer um diferencial aos debates e à atuação? Qual a sua expectativa quanto ao cargo?
Eu fico muito honrada por ter sido a primeira mulher, Defensora Pública brasileira, indicada a ocupar o cargo de DPI. Entendo que a representação de gênero é de extrema importância. No regulamento do DPI, produzido pela AIDEF, está presente a flexão de gênero sempre fazendo menção a defensor ou defensora pública interamericana. Alguns países (Argentina, Uruguai, Paraguai, Nicaragua, Republica Dominicana, Honduras e Equador) já haviam indicado Defensoras Públicas mulheres para a representação no Corpo de DPIs e o Brasil inaugura esta indicação indicação este ano.
 
A presença de uma mulher neste espaço é um diferencial porque traz à tona o debate da afirmação da mulher e de seus direitos humanos, ressaltando a construção de uma política institucional que dê privilégio a participação equitativa de homens e de mulheres.
 
A minha expectativa é a mais ampla possível, desde a possibilidade de troca de conhecimentos e de capacitação com outros Defensores Públicos Interamericanos e a maneira de atuação da Defensoria Pública em diferentes países, bem como a atuação em um processo internacional, produzindo a defesa de direitos em um processo de grande abrangência que, com certeza, sempre produz reflexos na forma como os direitos devem ser respeitados em todos os países da região.
Em maio, a CIDH (Comissão Interamericana de Direitos Humanos) declarou, publicamente, que atravessava uma crise financeira que poderia levar à perda de quase metade de seus funcionários. Como você considera que o Brasil pode atuar perante à Comissão em momentos de crise como esse? Quais medidas considera fundamental para o fortalecimento do Sistema Interamericano de Proteção e Promoção dos Direitos Humanos (SIDH)?
De fato, em 23 de maio de 2015, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) divulgou a severa crise financeira em que se encontrava e os efeitos negativos que a ausência de fundo poderia ocasionar no funcionamento do Sistema Interamericano de Direitos Humanos, reduzindo sua atuação. 
 
Entendo que, em razão do Brasil ser membro da OEA e signatário da Convenção Americana de Direitos Humanos, é imprescindível que o País assuma o papel de liderança em defesa do fortalecimento sistêmico da Comissão Interamericana de Direitos Humanos. O apoio financeiro é fundamental para o fortalecimento do sistema. Todo o trabalho da CIDH é financiado por contribuições financeiras dos países-membros, dos países-observadores e de outros possíveis doadores. 
 
É necessário salientar que a CIDH trabalha com as visitas feitas aos países para produção avaliativa da situação de violação de direitos humanos, quando produz informes e relatórios específicos, além de realizar audiências. Tudo gera gastos, e por este motivo, o incentivo à doações de aportes financeiros é importante.
 
Os Estados-Membros da Organização dos Estados Americanos (OEA) destinam cerca de 6% do orçamento da OEA para a CIDH, o que implica que o orçamento ordinário da CIDH não atinja 5 milhões de dólares, sendo insuficiente e incompatível com o mandado que tem que executar. É importante falar que os comissionados e os juízes da corte não recebem qualquer contrapartida salarial para atuarem no sistema, tratando-se de um trabalho sem remuneração em que tão somente se recebe apoio aos gatos efetuados.
A Organização dos Estados Americanos (OEA) já divulgou diversas resoluções que visam aprofundar o compromisso dos Estados-membros e também normatizar o trabalho dos defensores na proteção dos Direitos Humanos. Qual a importância desses documentos? Como eles podem ser trabalhados no Brasil, por exemplo?

Os documentos produzidos são de grande importância e precisam ser mais difundidos. Eles ajudam tanto a revelar dados e recomendações temáticas sobre violações de Direitos Humanos na região, como contribuem para a interpretação da posição do sistema sobre determinados assuntos. Os documentos podem ser trabalhados no auxílio de formulação de políticas públicas em âmbito municipal, estadual e federal. Além de ser capaz de auxiliar na formação de um plano de gestão institucional das Defensorias Públicas.     

Na sua opinião, quais temas que o Sistema Interamericano de Proteção e Promoção dos Direitos Humanos (SIDH) deve ter um olhar diferenciado?
Nota-se uma intensificação da litigância com temáticas relativas à violência contra a mulher e reivindicação de direitos sexuais e reprodutivos a partir de 2000, em um reflexo da consolidação de documento protetivo aos direitos das mulheres: a Convenção de Belém do Pará. 
 
Verifica-se também a conjugação de pautas tradicionais (como casos de tortura) com demandas mais arrojadas (como igualdade de direitos a casais homossexuais), que complexificam a agenda contemporânea de Direitos Humanos. Apesar deste aumento, penso que as demandas referentes aos direitos sexuais e reprodutivos; demandas relativas à garantia da autonomia sobre o próprio corpo, como o acesso a serviços de saúde adequados e isentos de interferências dos valores dos profissionais de saúde da rede pública nas decisões individuais das mulheres; e questões relativas à inserção da mulher nos espaços públicos merecem um olhar diferenciado.
 
Além disso, me parece que demandas que envolvam violações de direitos da Plataforma DESC [Direitos Econômicos, Sociais e Culturais] merecem ter o debate ampliado. Primeiro porque falta uma definição adequada do que seriam os direitos sociais e econômicos. E segundo porque os mecanismos para cumprimento destes direitos encontram-se em estado de desenvolvimento (construção e/ou consolidação).
O Defensor Público Interamericano representa e exerce a defesa legal de vítimas necessitadas que não possuam representação perante a Corte Interamericana de Direitos Humanos. Além disso, qual o papel do DPI no SIDH?

Acredito que o principal papel do DPI, para além da representação das vítimas tanto perante a Comissão Interamericana, como perante a Corte Interamericana, é ser multiplicador dos conhecimentos adquiridos nas capacitações. Segundo o regulamento, unificado da AIDEF perante o SIDH, o DPI tem ainda que apresentar relatórios periódicos de suas atividades na condução dos casos e participar obrigatoriamente de todos os cursos de capacitação organizados pela AIDEF.

Qual o papel da Corte Interamericana de Direitos Humanos?

A Convenção Americana estabeleceu como seu órgão jurisdicional autônomo, a Corte Interamericana de Direitos Humanos, instalada em São José da Costa Rica, desde 1979. A Convenção atribuiu à Corte Interamericana duas competências: uma de caráter consultivo e uma de caráter contencioso. Sendo assim, a Corte pode agir produzindo Opiniões Consultivas quando provocada a falar sobre determinado assunto, como deve agir quando um caso seja encaminhado para julgamento.

Seu objetivo é interpretar a Convenção Americana e outros tratados interamericanos de direitos humanos. A Corte é composta por sete juízes eleitos a título pessoal para um mandato de seis anos. Em sua competencia consultiva, cabe a Corte IDH emitir parecer relativo à interpretação de convenção ou de qualquer tratado referente à proteção dos direitos humanos nos Estados Americanos ou opina sobre a compatibilidade de preceitos da legislação doméstica diante dos instrumentos internacionais. A competência contenciosa está relacionada à resolução judicial dos casos.

Qual é a regra para que a Corte analise um caso? Qualquer caso pode ser analisado pela Corte?
Primeiro é importante saber que apenas os Estados e a Comissão Interamericana podem levar um caso à Corte IDH. Ou seja, as pessoas não podem recorrer diretamente à Corte, devendo apresentar uma denúncia à Comissão e seguir com os passos até que o caso chegue à Corte. Para que um caso seja submetido ao SIDH, ele deve preencher os requisitos de admissibilidade contidos no art. 46 da da Convenção Americana de Direitos Humanos, devendo observar que:
 
Quanto à matéria:  a alegação de violação a Direitos Humanos cometidas em países membros da OEA com base em direitos da Carta da OEA e da Declaração Americana de Direitos Humanos (DADDH)
 
Quanto ao tempo: observar o prazo de seis meses da decisão definitiva que violou o direito;
 
Quanto à pessoa: nome, a nacionalidade, a profissão, o domicílio e a assinatura da pessoa/pessoas ou do representante legal da entidade que submeter a petição;
 
Quanto ao lugar: o ESTADO deve ter reconhecido a jurisdição da Corte. Além disso é imprescindível que tenha havido esgotamento dos recursos internos no país para que o caso seja submetido ao SIDH.
 
Para que um caso seja analisado pela Corte, ele tem que ter vindo diretamente de um Estado ou encaminhado pela CIDH, obedecendo a admissibilidade apontada.  
E a Comissão Interamericana. Qual é o seu papel?

A Comissão Interamericana é um órgão com papel dúplice. Ela é o órgão principal da OEA, encarregado de zelar pelos Direitos Humanos, incumbido até do processamento de petições individuais com base em direitos da Carta da OEA e da Declaração Americana de Direitos Humanos (DADDH). É também órgão da Convenção Americana, analisando petições individuais e interpondo ações de responsabilidade contra um Estado perante a Corte IDH.

Ela tem como objetivo: promover, fiscalizar e proteger os Direitos Humanos na América, podendo fazer recomendações aos governos dos Estados-Partes, preparar estudos e relatórios, requisitar informações, examinar denúncias e submeter um relatório anual à Assembleia Geral da OEA. A Comissão é composta por sete comissionados eleitos para mandato de quatro anos podendo ser reeleito por mais quatro anos, dentre pessoas de reconhecido saber em direitos humanos. Num primeiro momeo, a Comissão exerce uma função conciliatória buscando estabelecer uma solução amistosa com o Estado. Não sendo possível a conciliação, a Comissão pode elaborar um relatório a respeito do caso, com recomendações que, se não forem seguidas, autorizam-na a enviar o caso para Corte Interamericana de Direitos Humanos. A CIDH também pode aplicar medida cautelar.

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