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Nº 24 - 16 de setembro de 2015
Salo de Carvalho
É professor adjunto de Direito Penal da Universidade Federal do Rio de Janeiro e especialista em criminologia.

De 4 a 7 de novembro, a ANADEP, em parceria com a Associação dos Defensores Públicos do Paraná, promoverá o XII Congresso Nacional de Defensores Públicos. Sob o tema “Defensoria como Metagarantia: transformando promessas constitucionais em efetividade", o Congresso será realizado na Faculdade de Direito da Universidade Positivo do Paraná, em Curitiba. A ideia é que o CONADEP oportunize o debate dos principais temas relacionados à Instituição e ao papel do defensor público na sociedade.

Uma das palestras mais esperadas do evento contará com especialistas renomados que discutirão o tema: "Política criminal do super-encarceramento: é possível falar em abolicionismo penal no Brasil?". O painel será formado pelo defensor público do Paraná André Giamberardino; pelo professor universitário, pesquisador, escritor e advogado brasileiro Juarez Cirino (professor); pelo delegado Orlando Zaccone (Rio de Janeiro); pelo professor e especialista em criminologia Salo de Carvalho.

Em entrevista exclusiva à ANADEP, o painelista Salo de Carvalho adianta um pouco sobre sua fala no CONADEP. Segundo ele, a ideia é problematizar a situação prisional brasileira e tentar apontar algumas alternativas, sobretudo aquelas que estão no horizonte institucional da Defensoria. Durante a conversa, o professor falou também sobre o panorama atual do sistema carcerário do Brasil, que hoje tem a quarta maior população carcerária do mundo. Além disso, abordou sobre a atuação dos atores do sistema de justiça para o acesso à justiça, a implantação das audiências de custódia no Brasil e a banalização do ensino do Direito no país. 

Perfil: Salo de Carvalho é professor adjunto de Direito Penal da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Mestre em Direito pela Universidade Federal de Santa Catarina (1996). Doutor em Direito pela Universidade Federal do Paraná (2000). Pós-Doutor em Criminologia pela Universidad Pompeu Fabra (Barcelona, ES) (2010). Pós-Doutor em Criminologia pela Universitá di Bologna (Bologna, ITA). Pós-Doutorando em Filosofia na Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul.

"Política criminal do super-encarceramento: é possível falar em abolicionismo penal no Brasil?" será no dia 5 de novembro (quinta-feira), às 14h, no auditório secundário. Outras informações sobre o XII CONADEP acessar: http://congressoanadep.com. 

"A Defensoria é a principal instituição de resistência ao punitivismo e ao genocídio em massa provocado pelo grande encarceramento."
ANADEP - 
O Brasil tem hoje a quarta maior população carcerária do mundo. O país apresenta dados assustadores em relação ao sistema penitenciário: aumento de 160% da população carcerária em 14 anos, o que resulta em 600 mil pessoas presas. Com este contexto é uma utopia falarmos em abolição penal no Brasil? O que deve ser feito para mudar esta realidade?

Exatamente em razão deste contexto é que devemos falar em abolicionismo. Seria ingênuo e ilógico esperar reduzir o encarceramento para que medidas estruturais fossem tomadas. É exatamente a radicalidade da situação que impõe o debate profundo sobre a crise e as possibilidades de superar este modelo carcerocêntrico que produz mais violência do que pretende prevenir.

O sistema prisional hoje tem apenas 370 mil vagas para comportar o dobro da população carcerária. Além disso, 41% dos presos no país aguardam julgamento, o que agrava a situação de superlotação nas penitenciárias. Você considera que a legislação atual está desconectada com esta realidade?

Antes de considerar que a legislação está desconectada da realidade prisional, me parece que é fundamental ver como os atores do sistema penal, sobretudo os juízes, estão desconexos desta realidade. Não por outra razão, no recente julgamento da Medida Cautelar na ADPF 347, o tema central era o da responsabilidade do Poder judiciário neste estado de coisas inconstitucional que são as prisões brasileiras. Se temos um Judiciário que entende que o seu papel é na efetivação da segurança pública e não na garantia dos direitos, temos um sério problema. Antes de pensar em reformar as leis temos que criar mecanismos para mudar as mentalidades institucionais.

E sobre as audiências de custódia - prática de levar em 24 horas todos os presos em flagrante à presença de um juiz que irá analisar se o encarceramento é necessário - é um avanço para a situação carcerária do Brasil?

Creio que é uma medida extremamente necessária, notadamente em razão do excesso de prisões cautelares que temos no Brasil. Trata-se de um procedimento eficaz para garantir um processo democrático. A audiência de custódia faz com que o juiz avalie uma pessoa de 'carne e osso’ e não apenas ‘autos’; obriga o julgador pensar que há uma pessoa que sofre os efeitos da sua decisão. Traz mais responsabilidade ao ato de julgar, por isso entendo imprescindível.

Você considera que o ensino do Direito no Brasil está banalizado? Você acha que a questão do acesso à justiça hoje é debatido dentro das salas de aulas das universidades?

Tenho afirmado que o ensino do Direito no Brasil acabou. As Faculdades de Direito ensinam, hoje, qualquer coisa, menos Direito. Poucos centros de ensino, normalmente públicos, ainda resistem à vulgarização do ensino. Infelizmente a lógica mercantilista que tomou o ensino do Direito só interessa àqueles que enriqueceram com as Faculdades privadas de péssima qualidade que proliferaram nos últimos 20 anos. E é lamentável que o MEC e a OAB não tomem medidas sérias, medidas que implicariam no real fechamento de inúmeras instituições e milhares de vagas. Lembro que mês passado o Conselho Federal da OAB informou o CNJ que o Brasil possui 1.280 Faculdades de Direito, com quase 800 mil advogados inscritos e cerca de 3 milhões não aprovados no exame. O mesmo informe aponta que o resto do mundo possui em torno de 1.100 cursos.

Na sua opinião, a grande aceitação e campanha dos brasileiros (85% segundo pesquisa do DataSenado de julho de 2015) em prol da aprovação da redução da maioridade penal mostra que é preciso trabalhar mais este tema com a sociedade brasileira?

Pesquisa de opinião, em temas sensíveis como este, não podem ser meramente quantitativas, com respostas padrão “sim” e “não”. No Uruguai, no início do processo de plebiscito para redução da maioridade, os índices de aceitação da redução eram semelhantes. Mas normalmente estes números são reduzidos quando o debate é qualificado, ou seja, o público é informado do real estado de coisas e das respostas existentes. Foi o que aconteceu no Uruguai. Aliás, pesquisas criminológicas demonstram que normalmente o público, quando é indagado sobre qual a melhor medida para determinados casos (penais, sobretudo), tende a dar uma resposta menos punitiva que a do Judiciário e do Legislativo. Precisamos de informação com conteúdo, sobretudo.

E, por fim, o que os defensores públicos podem esperar do seu painel durante o evento?

Pretendo problematizar a situação prisional brasileira e tentar apontar algumas alternativas, sobretudo aquelas que estão no horizonte institucional da Defensoria. Para mim, a Defensoria é a principal instituição de resistência ao punitivismo e ao genocídio em massa provocado pelo grande encarceramento.

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